quinta-feira, 12 de agosto de 2021

#8 Um sonho de livro

Uma coisa engraçada sobre a minha existência é que eu sonho muito quando durmo. Praticamente todas as noites desde a minha infância eu acordo ressaqueada de lembranças: corridas, aventuras, vistas inacreditáveis, pessoas novas e velhas, as mais diferentes sensações e sentimentos. Além disso, sempre que eu tenho uma memória mais vívida e cronológica do sonho eu gosto de contar para alguém. Tem sonhos que eu contei com tantos detalhes que até hoje me lembro da cena que descrevi.

Acontece que uma noite eu sonhei com uma praia cinza cheia de pedras em um dia cinzento. Não sei se eu estava lá de fato ou apenas assistindo em plano astral, mas eu reparei muito em como a areia parecia pálida, o mar não era azul-esverdeado e o céu parecia errado... era como se eu estivesse em uma foto em preto-e-branco. Sei que foi um sonho que durou pouco tempo, mas no momento parecia que vários minutos se arrastavam enquanto eu olhava as ondas vindo e voltando e percebia enfim um ponto de cor na paisagem: alguns bichos enormes, maiores do que uma pessoa adulta, bem laranjas e que lembravam bastante lagostas. Elas chegavam com as ondas, se esticavam para cima e batiam as garras. Algumas ficavam, outras iam embora, mas eu só ficava lá olhando através da minha consciência, completamente encantada com o contraste dos tons de cinza com o laranja. Era uma sensação de paz e ao mesmo tempo segurança por estar longe, mas isso é tudo que me lembro.

No mesmo dia desse sonho tão único e cheio de sensações, eu fui visitar o Paz, que era grande fã das peripécias absurdas que o meu subconsciente me mostrava ao fechar dos olhos. Conversa vai, conversa vem e eu falei que precisava contar o sonho daquela noite.

Contei empolgada e temerosa pelas loucuras da minha cabeça, incluindo mais detalhes que lembrava na época e hoje em dia me escapam. A cada palavra ele parecia ficar mais concentrado e me deixava curiosa. Terminando o relato ele não disse nada, mas se virou para acessar o rack da televisão, abriu uma gaveta e tirou um livro. Virando de volta pra mim, me entregou o livro animado dando aquela risada empolgada tão dele. Eu não lembro as exatas palavras, mas eu lembro a mensagem: "leia esse livro, depois me devolva que eu te darei o próximo e assim seguimos. Você acabou de me descrever uma cena exata de um dos livros dessa saga, então você precisa ler isso." 

A saga em questão era A Torre Negra, do Stephen King. Eu peguei aquele livro nesse dia, mas enrolei pra ler. Enrolei muito, assumo. Li It - A Coisa, do mesmo autor, antes de olhar para O pistoleiro. Infelizmente deixamos de nos falar muito tempo antes que eu criasse a coragem de me enroscar com uma saga novamente, que demorou tanto em parte porque eu sentia que terminando a leitura eu deveria devolver o livro e seria muito estranho.

Mas eu li. E quando terminei já baixei o próximo no meu kindle, já que não havia mais como pegar emprestado. Foi então que eu me encontrei com a cena do meu sonho e terminei de me apaixonar pela saga. Ainda lembro de como me arrepiei com a descrição e a lembrança do que há tantos anos paira na minha memória. Foi um daqueles raros momentos malucos em que você põe em dúvida a sua realidade e eu só pensava em como eu talvez tenha aberto uma das portas sem querer, sem nem saber como.

Sigo lendo, agora já no quarto livro, mas nunca me esqueço desse sonho e desses dois momentos decorrentes dele. Hoje sou super fãzinha do Sr. King.