quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

O tempo que passa

Eu tenho muita consciência hoje em dia sobre o tempo. Sobre como ele cura ou deixa pra trás tudo que nos acontece. Sobre como ele é gentil e cruel ao mesmo tempo.

Já estou mais perto dos meus 30 anos do que da época em que comecei a escrever nesse blog, totalmente alheia sobre o efeito e o peso do tempo. Mas como eu saberia, não é mesmo? Eu era só uma pré adolescente passando por coisas pela primeira vez e sentindo todo o desespero de achar que 50 anos é o fim da vida.

Sim, hoje em dia é risível pensar em todas as vezes em que a imaturidade me fez agir da única forma que parecia possível no momento. É engraçado sentir vergonha de momentos que vivi e fui totalmente plena na minha forma de agir. Aquelas Brunas não existem mais, mas fazem de mim tudo o que sou hoje.

Não que seja muita coisa, afinal eu ainda passo por muitas coisas pela primeira vez, mas dessa vez torço todos os dias para que essa sensação continue acontecendo, seja por uma coisa boa ou ruim.

Eu já tenho tempo suficiente na Terra para não me lembrar de tudo o que já passou e às vezes isso me assusta. Acumular lembranças e saber que o tempo não volta é muito louco. Perceber como isso acontece com todo ser humano é ainda mais maluco na minha cabeça. 

É, ver pais e avós hoje em dia e pensar como foi para eles viverem tanto e verem pequenos seres passarem pelas mesmas experiências sem poder fazer muita coisa (afinal, cada um vive uma vida, mesmo que algumas coisas se repitam) é uma coisa que me conforta e dói.

Gostaria de ter tido uma conversa sobre o futuro quando era mais nova, mas não sei se eu teria capacidade de entender a grandiosidade do tempo e do seu passar. Não acho que conseguiria absorver a sensação de quaisquer palavras que tentassem me explicar esse maremoto que é olhar para trás e ver que muito pouco dos meus maiores problemas durariam mais do que uma semana.

Envelhecer é uma dádiva, mas saber que essa vida e essa juventude não duram para sempre é uma porrada que mesmo hoje eu me recuso a levar. Pensar que meu corpo, músculos, voz, cabeça e pensamentos nunca serão iguais ao passado ainda causa uma ansiedade, mas me faz lembrar de como eu sofria com tudo isso quando hoje olho para a Bruna antiga e ela me parece perfeita.

Todos os dias eu me esforço para aproveitar cada segundo e gravar com carinho as boas coisas que me acontecem, mas eu sei que ano que vem já não saberei quase nenhum detalhe de nenhuma cena. Tagarelar sozinha aqui continua sendo uma terapia e isso é bom. Escrever é colocar em frases a sequência de imagens que passa na minha cabeça e eu espero no futuro olhar para todas essas postagens com mais carinho e respeito do que consigo fazer hoje em dia.

Por mais que algumas experiências se repitam, eu sei que nunca mais vou ser exatamente essa Bruna pensando sobre o tempo. Inclusive, espero que não. 

sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

#9 Aeroporto

 A vida inteira eu fui muito acostumada dentro da família a ninguém precisar depender de transporte particular ao chegar e voltar de uma viagem. Fosse de ônibus ou de avião, a chegada na cidade onde morávamos contava sempre com uma cara familiar no meio da pequena multidão aguardando na saída do desembarque.

Às vezes era minha mãe, muitas vezes era meu pai e já houve casos em que era minha irmã. O momento de voltar pra casa incluía aquele aceno com as mãos dizendo "estou aqui" ou um cartaz bobo com meu nome apenas pela diversão. Eram momentos em que eu sempre me senti amparada, principalmente quando era mais nova e achava qualquer aeroporto grande e confuso demais, mesmo quando estava acompanhada de alguém da família.

Meus privilégios me permitiram viajar de avião várias e várias vezes nesses meus quase 30 anos e diversos desses encontros me marcaram de alguma forma, mas hoje numa conversa eu me lembrei especificamente de uma viagem à trabalho em que eu chegaria sozinha, para uma casa vazia.

Meus pais já não moravam mais na mesma cidade que eu e minha irmã, que dividia a casa comigo, tinha acabado de ir viajar para ficar com eles. Descendo do avião eu lembro de sentir que estava sozinha e no quanto seria estranho ter que descobrir onde pegar um uber ou táxi para ir pra casa. Eu até havia pensado de pedir para alguma outra pessoa me buscar, mas não queria dar trabalho. Passando pelo desembarque vieram as lágrimas, porque eu sou uma manteiga e choro por qualquer coisa, mas segurei com uma fungada e segui meu caminho.

Mesmo andando cabisbaixa, quando a porta se abriu eu vi o Paz e a minha memória não me deixa ter certeza se ele estava segurando uma flor ou não, mas isso não era realmente importante. Nessa hora as lágrimas vieram de surpresa e eu me senti amada como todas as vezes antes que voltei pra casa. Eu senti uma gratidão enorme por um gesto tão simples e pequeno, que só atendia a um capricho.

É uma daquelas lembranças que ficam flutuando ali na memória sem realmente se apresentarem, mas ela vem como um abraço quentinho de um momento difícil. Sou muito feliz por ser capaz de lembrar dessas pequenas coisas do nada e muito grata por ter tido momentos tão bons na minha memória.

terça-feira, 26 de outubro de 2021

Não sei o que é isso.

 Eu não sei muito sobre depressão de fato, mas acho que talvez eu esteja à beira de um surto e ao mesmo tempo que parece ridículo, parece inevitável.

De repente eu me pego quase chorando por ver a chuva caindo lá fora e não sei se meus olhos ardem da claridade ou (sem saber) quero acompanhar o pranto do céu. Poderia passar o dia inteiro comendo ou dormindo, assistindo seriados que não me obrigam a pensar ou jogando jogos de celular super bestas.

Não tenho a menor vontade de levantar pela manhã e conto os segundos para ir embora do trabalho, onde não consigo me concentrar em tarefa nenhuma e não vejo sentido em me esforçar para arranjar novas demandas.

Me causa pânico ver que não estou fazendo tarefas domésticas que sempre fiz, como lavar louça e roupa. De repente quero correr para abraçar os gatos ou pelo menos encostar no namorado e sentir que eu ainda não atravesso corpos físicos. Tem momentos em que parece que eu simplesmente não existo. Tem momentos em que eu realmente gostaria de não existir.

É muito fácil manter a inércia. Não sinto mais o menor ímpeto de fazer um bolo, preparar qualquer receita que seja ou postar coisas que atraiam mais clientes. Eu gostaria de não ter mais nenhuma obrigação. Mas não sei até onde isso seria uma boa situação.

É louco esquecer de me olhar no espelho e quando me vejo em fotos não me reconhecer. Se precisar descrever, eu não sei mais como é meu rosto. Meu corpo é muito maior do que eu sinto e conheço e não sei quando isso aconteceu.

Eu não me sinto mais confortável nas minhas próprias roupas e já não tenho zelo pelo meu cabelo. Eu só quero me sentir confortável e abraçada por tecidos que não me apertem. E mesmo assim falta vontade para comprar qualquer coisa nova porque passar por um provador cada vez tem me dado mais vontade de chorar, mas não posso.

Queria estar sempre cercada de amor mas me sinto mais confortável sozinha. E sozinha vou me fazendo, com saudade de não estar sozinha mas sem forças pra ter companhia. Ansiando por um conforto mas querendo ser deixada em paz.

Alguns dias são mais difíceis que outros, mas todos os dias parece mais próximo o momento em que eu vou precisar parar para não explodir.

domingo, 12 de setembro de 2021

100, um número mágico

Já passa da 1h da madrugada e de repente me deu comichão de saber quando seria meu 100° bolo esse ano, recorde anual absoluto até hoje, em 6 anos de Lunardi Doces. 

Contando um a um no calendário do celular, onde sempre anoto tudo, me dou conta de que ele já foi.
No dia 08 de setembro eu entreguei o 100° bolo encomendado. 100 vezes eu puder participar de comemorações de forma indireta. 100 vezes eu fechei um orçamento, fui paga e dei o meu melhor para entregar um produto com excelência. 

Em 2017 foi um bolo, o da Nate, primeiro de todos. Em 2018 foram 6, até onde eu achei. De 2019 não tenho o registro exato, mas não deve ter passado de 20. 2020 de repente eram 90 bolos. E agora, setembro de 2021, e eu olho pra trás sem acreditar e com lágrimas nos olhos. Que desdobramento! Estou sem fôlego de euforia, apesar do cansaço. Sinto um orgulho inesperado e completo. Um número redondo e marcante como esse é algo mágico no momento. Mesmo com o ritmo cada vez mais apertado eu nunca achei que fosse atingir essa marca tão expressiva.

Meu tempo é curto e minha experiência é pouca, mas eu dei o máximo de mim em cada etapa de crescimento dos últimos anos. Claro que nada disso teria acontecido sem o apoio e ajuda da minha família incrível, mas uma grande parte do mérito é meu e estou abraçando isso com braços e pernas. Num dia em que me senti inútil, sem perspectiva e cansada, essa noção me pegou pela mão e me colocou sentadinha na cadeira do merecimento. Eu queria só abraçar cada pessoa que confiou no meu trabalho e pagou por ele. Não foi favor, não foi na amizade, não foi de qualquer jeito: foi um negócio fechado todas as vezes.

Eu lembro de quase todos os bolos que já fiz, lembro perfeitamente de todas as lágrimas que derramei. Lembro nitidamente dos sorrisos das crianças aniversariantes e tenho noção da quantidade infindável de noites mal dormidas por falta de horas no dia. Nós, como Lunardi Doces, merecemos esse número e eu estou absolutamente orgulhosa.

Na falta de mais palavras, eu só queria dizer: <3.

quinta-feira, 12 de agosto de 2021

#8 Um sonho de livro

Uma coisa engraçada sobre a minha existência é que eu sonho muito quando durmo. Praticamente todas as noites desde a minha infância eu acordo ressaqueada de lembranças: corridas, aventuras, vistas inacreditáveis, pessoas novas e velhas, as mais diferentes sensações e sentimentos. Além disso, sempre que eu tenho uma memória mais vívida e cronológica do sonho eu gosto de contar para alguém. Tem sonhos que eu contei com tantos detalhes que até hoje me lembro da cena que descrevi.

Acontece que uma noite eu sonhei com uma praia cinza cheia de pedras em um dia cinzento. Não sei se eu estava lá de fato ou apenas assistindo em plano astral, mas eu reparei muito em como a areia parecia pálida, o mar não era azul-esverdeado e o céu parecia errado... era como se eu estivesse em uma foto em preto-e-branco. Sei que foi um sonho que durou pouco tempo, mas no momento parecia que vários minutos se arrastavam enquanto eu olhava as ondas vindo e voltando e percebia enfim um ponto de cor na paisagem: alguns bichos enormes, maiores do que uma pessoa adulta, bem laranjas e que lembravam bastante lagostas. Elas chegavam com as ondas, se esticavam para cima e batiam as garras. Algumas ficavam, outras iam embora, mas eu só ficava lá olhando através da minha consciência, completamente encantada com o contraste dos tons de cinza com o laranja. Era uma sensação de paz e ao mesmo tempo segurança por estar longe, mas isso é tudo que me lembro.

No mesmo dia desse sonho tão único e cheio de sensações, eu fui visitar o Paz, que era grande fã das peripécias absurdas que o meu subconsciente me mostrava ao fechar dos olhos. Conversa vai, conversa vem e eu falei que precisava contar o sonho daquela noite.

Contei empolgada e temerosa pelas loucuras da minha cabeça, incluindo mais detalhes que lembrava na época e hoje em dia me escapam. A cada palavra ele parecia ficar mais concentrado e me deixava curiosa. Terminando o relato ele não disse nada, mas se virou para acessar o rack da televisão, abriu uma gaveta e tirou um livro. Virando de volta pra mim, me entregou o livro animado dando aquela risada empolgada tão dele. Eu não lembro as exatas palavras, mas eu lembro a mensagem: "leia esse livro, depois me devolva que eu te darei o próximo e assim seguimos. Você acabou de me descrever uma cena exata de um dos livros dessa saga, então você precisa ler isso." 

A saga em questão era A Torre Negra, do Stephen King. Eu peguei aquele livro nesse dia, mas enrolei pra ler. Enrolei muito, assumo. Li It - A Coisa, do mesmo autor, antes de olhar para O pistoleiro. Infelizmente deixamos de nos falar muito tempo antes que eu criasse a coragem de me enroscar com uma saga novamente, que demorou tanto em parte porque eu sentia que terminando a leitura eu deveria devolver o livro e seria muito estranho.

Mas eu li. E quando terminei já baixei o próximo no meu kindle, já que não havia mais como pegar emprestado. Foi então que eu me encontrei com a cena do meu sonho e terminei de me apaixonar pela saga. Ainda lembro de como me arrepiei com a descrição e a lembrança do que há tantos anos paira na minha memória. Foi um daqueles raros momentos malucos em que você põe em dúvida a sua realidade e eu só pensava em como eu talvez tenha aberto uma das portas sem querer, sem nem saber como.

Sigo lendo, agora já no quarto livro, mas nunca me esqueço desse sonho e desses dois momentos decorrentes dele. Hoje sou super fãzinha do Sr. King.

quinta-feira, 29 de julho de 2021

Síndrome do ninho vazio - irmã

 28 anos morando perto. Nossa vida toda - até agora - com residências sempre na mesma cidade, a no máximo 15 minutos de carro de distância (porque quilômetros valem nada no Distrito Federal).

Já morei muito distante de todos da minha família, até de dona mãe e de dono pai, mas nunca da minha irmã. Desde quando éramos um conjunto bem pequeno de células que estamos juntas e a sensação sempre foi de ter um pedaço de mim fora do meu corpo. E aí agora ela vai para longe de mim por tempo indefinido pela primeira vez. Eu não sei o nível de egoísmo por estar chateada com isso, mas é algo natural, eu acho. Nunca é fácil dizer tchau e é muito mais difícil quando alguém do seu cotidiano semanal deixa de ser semanal do nada.

Foram anos e anos até a gente conseguir desenvolver essa parceria e amizade que temos hoje e talvez a maior parte da chateação venha daí: o medo de perder a melhor relação que eu construí na vida. Porque não significa nada nascer na mesma família... para um laço forte é preciso trabalho, dedicação, insistência, resiliência, pelo menos um pouco de harmonia e muita força de vontade, que foi o que a gente mais teve pra manter tudo em pé.

No dia 28 de maio de 2013 eu escrevi uma coisa e não sei se algum dia vou conseguir me expressar tão bem novamente, então repito:

"Hoje não é seu dia, seu (nosso) aniversário, dia do amigo ou da irmã. Hoje é só mais uma terça-feira comum nas nossas vidas. Hoje foi outro daqueles dias em que eu acordei com você se arrumando para o estágio e cheguei em casa quando você já estava apagada na cama. Mas eu queria te lembrar que eu te amo hoje também. Bastante, inclusive. Porque eu não quero que você ache que eu só te amo em dias especiais, quando você me faz algum favor ou quando mamãe manda.

Eu quero que você tenha certeza sempre de que você é minha irmã mais amada, querida e cuidada. Desde a época em que dividíamos uma barriga até hoje e para sempre. Mesmo quando eu não pego água pra você, estrago nossos jogos numa partida de buraco, largo suas coisas em qualquer lugar ou brigamos por qualquer motivo. Até quando você me sacaneia, faz drama, usa minhas roupas sem pedir ou me liga para me mandar voltar pra casa.

Ser sua irmã é uma coisa linda. É rir de nada, chorar junto, bater e apanhar no treino e revezar no volante quando a outra quer beber. Eu acho que você sabe mas eu queria reforçar tambem que você é o meu maior orgulho. Você é a mulher mais esforçada e determinada que eu conheço. Não há nada que possa te impedir de fazer algo quando você realmente quer fazer. E isso é comprovado por todas as vezes que você passou na UnB, todos os professores, alunos, pais, colegas e contratantes que você conquistou simplesmente por amar o que faz e fazer bem feito. Fora isso você ainda é linda, engraçada, um amor de pessoa, a melhor esportista nata que eu já vi, tem personalidade forte, coração mole, criatividade infinita, inteligência invejável e altruísmo inabalável. Você é admirável, xu.

Eu literalmente não aprendi a viver sem você. Nós passamos nossa vida inteira juntas e, por mim, não precisa ser diferente. Coisas bobas como você pedindo para dormir comigo depois de um pesadelo ou me amparando quando eu não parava de chorar nas minhas crises existenciais. Você tem que saber que eu sempre estarei do seu lado assim como você sempre está do meu. E não apenas como retribuição mas sim porque você é minha irmã, minha gêmea "caçulinha".

E é por essas e tantas outras coisas que você não pode pensar nunca - nem por um segundo - que eu não te amo muito. Mesmo brava, triste, #chateada, bolada ou dormindo... Eu te amo.

Sei que não sou de demonstrar isso muitas vezes e acabo fazendo você achar que eu não me importo, mas saiba: quando eu tento te morder, te torço, abraço sua cabeça ou te mantenho acordada até tarde só pra contar uma coisa besta é porque eu tô com saudade e não sei dizer. Então perdoa se eu te machucar de vez em quando... Perdoa porque sua maninha aqui não é a personificação da fofura como você. Mas ela te ama assim mesmo, tá? De verdade. Ontem, antes disso, hoje, amanhã e sempre."

A gente já não está mais na faculdade, inclusive você acabou de se formar (uhul!), não estagiamos já há muito tempo e não dividimos o mesmo teto faz alguns anos, mas só isso mudou. Todo o resto permanece, principalmente o amor e a admiração, que só fizeram aumentar.

Eu não vou morrer de saudade, mas eu sei que vai doer pelo menos um pouquinho toda vez que eu só quiser contar alguma coisa e tiver que ser pela tela de um celular. Ainda bem que perto o suficiente e que não demora muito pra gente se visitar, mas saber disso não me conforta em nada ainda.

Vai, xu, voa. Ganha mais um pouco do mundo, que é todinho seu. Vira e mexe a gente vai se ver e eu sei que vai ser como se você nunca tivesse ido. Saiba que casa pra mim é onde a gente se junta. Te amo. De verdade. Ontem, antes disso, hoje, amanhã e sempre.

quarta-feira, 7 de julho de 2021

Impostora

De repente tão pequena num lugar onde quem manda sou eu. Sem nem saber como aconteceu, vi minhas mãos completamente incapazes de fazer as mesmas coisas que já faço até automaticamente, por tanta repetição. As coisas que eu mesma organizei parecem erradas. Minhas anotações e receitas grudadas na parede parecem erradas. O preparo que eu acabei de terminar parece errado.

Como alguém pode achar que eu sei o que estou fazendo? Como pode alguém confiar que eu vou dar a mesma sorte de fazer algo gostoso de novo? Quem eu sou pra divulgar um trabalho em redes sociais que eu toda vez me aventuro a fazer? Como eu posso me achar digna de cobrar por um trabalho tão amador? Será que as pessoas tem pena e por isso são tão legais comigo?

Sem saber porque, me sento no chão da minha cozinha apertada, entre o forno que a cada dia está mais temperamental e minha bancada com manchas de glitter. Perdida. Irracional. Aérea. Inoperante. Estrangeira no meu próprio reino.

E aí eu me forço a ver as fotos e a evolução do meu trabalho. Eu faço isso há mais de 6 anos. Eu aperfeiçoei minhas receitas e nunca parei de aprender. Repito que é incrível como a mente humana pode sabotar um trabalho de tanto tempo por tão pouco, por algo tão rápido. E ainda assim fica essa dúvida: será só impressão ou eu realmente sou uma impostora? 

sexta-feira, 18 de junho de 2021

Teto de madeira

Não era bem um quarto. Era um mezanino sobre a sala de jantar com duas saletas sem portas nos cantos. Uma delas era onde eu dormia.
Era o ambiente mais magico que eu tive durante a minha adolescência e eu amava, mesmo sem porta, mesmo com o calor que fazia por conta do carpete, mesmo com o espaco que tinha bem em cima da minha cama que permitia a passagem de luz e som do meu "quarto" para a sala e vice-versa.
O teto era inclinado, tendo seu ponto mais baixo na parede onde ficava encostada a cabeceira da minha cama, e no ponto mais alto meu pai tinha realizado meu sonho de pendurar uma daquelas cadeiras suspensas.
Eu me sentia no meu próprio sótão num pequeno chalé. Durante as insônias eu encarava aquelas ripas de madeira a pouco mais de um metro e meio da minha cabeça e me sentia longe, sozinha e em paz. A vida que aquela madeira já teve me aquecia o coração e fazia com que eu me sentisse segura e acolhida. Logo eu, que nunca fui a maior fã de estar em meio à natureza.
Eu olhava o verniz e o brilho me levava longe. Com a imaginação afloradíssima que eu tinha na época, cada reflexo que vinha do vão parecia uma estrela cadente e eu já pedi e desejei inúmeras coisas, fechando meus olhos pra poder encontrar tudo em sonho.
Aquele teto nunca pareceu que ia cair na minha cabeça. Mesmo sua inclinação não causava a impressão de que deslizaria ou de que estava perto demais. Mesmo em meio às crises, quando eu desabava de chorar, ele estava lá soltando o leve cheiro de madeira e brilhando pra mim no escuro. Eu amava aquele quarto e amava aquele teto.
Eu não sei porque lembrei lembrei disso agora, porque quando penso naquela casa me brotam tantas outras lembranças diferentes... mas aqueceu o coração nessa noite fria de junho. Espero um dia encontrar outro teto assim.

quarta-feira, 7 de abril de 2021

Medo de morrer

Eu gostaria de ter percebido mais cedo que a vida não é um filme ou um vídeo game. Queria ter entendido, pelo menos alguns anos no passado. que aquele dia nunca mais se repetiria e que eu nunca mais viveria aquele momento novamente. Nunca o mesmo, nunca igual.

Eu me dei conta apenas por agora, próxima do meu 29° aniversário, de que não importa quantas vezes eu consiga refazer uma fase, rever um filme, repassar uma conversa, reler um livro, eu nunca vou poder fazer a mesma coisa com a minha vida.

Eu penso todos os dias em quantos dias ainda eu posso ter. Em quantas cicatrizes meu corpo ainda consegue aguentar. Em quantas ressacas meus órgãos estão aptos a superar. Em quantas batidas meu coração dará até se recusar a continuar.

Todos os dias eu morro de medo de não aproveitar o melhor que posso dos meus dias porque essa é a minha única chance de viver cada um deles. Toda decisão eu penso se pode ser a pior que eu já fiz nos últimos tempos ou se vai me levar para o melhor caminho possível de agora em diante. É realmente ridículo o quanto eu penso nas reviravoltas da vida com os "e se..." do passado.

Dá muito medo de viver por ter medo de morrer. Esse paradoxo nunca me causou tanta angústia.

Eu achei que nunca ia desejar uma máquina do tempo, mas como eu desejo. Tudo que eu queria era mais tempo. De um tempo que eu nem sei quanto vai durar, mas que eu já morro de medo de ter fim.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

#7 Filmes clássicos e clipes de papel

Curiosamente, uma das épocas em que eu mais aprendi sobre convívio social foi durante meu primeiro estágio da faculdade. Eram 5 horas por dia, que eu normalmente fazia à tarde, chegando correndo da UnB depois do almoço e às vezes voltando correndo também, para as aulas da noite.

Não precisa me conhecer muito pra saber que sou tímida, mas naquela época eu era um verdadeiro bichinho do mato. Até hoje fico fascinada com a sorte que tive de ser tão bem acolhida e mimada por todos os meus "chefinhos" da divisão. Não tive a mesma sorte com o estágio seguinte, onde o mundo começou a me mostrar suas garras e dentes, mas é conversa para outra situação.

Acontece que não existe lembrar do estágio e não lembrar de como eu fui arrastada pra fora da minha concha confortável, onde eu só precisava falar com quem sorria pra mim ou me tratava bem (pois é, batendo na porta dos 20 anos e ainda agindo como uma criança assustada, veja só). O lugar e a época onde eu tinha tão poucas responsabilidades profissionais que uma das minhas missões diárias era desenhar num jardinzinho zen que havia na mesa de um dos meus supervisores.

Dentre todas as lembranças divertidíssimas, vergonhosas, felizes e chocantes que eu tenho desses dias, eu sempre penso com carinho na vez em que estava conversando coisas rotineiras com o Diego e eu contei que nunca havia assistido Star Wars ou Senhor dos anéis ou que havia dormido assistindo O Poderoso Chefão. Neste ponto de interesse específico a memória falha, mas o que mais me faz rir é lembrar que a resposta automática deste homem foi encher a mão de clipes de papel e me bombardear com um por vez, reclamando do absurdo que eu tinha acabado de falar.

É das coisas da vida que eu fico feliz de ter vivido, porque foi tão inesperado e ridículo que não tem como não marcar na história como algo a ser contado. Eram dias felizes e eu sabia. Que saudade da "minha" GESAD 01.